A luta contra a escala 6×1 e a estratégia de guerra de classes no setor privado

Publicado no Jornal O Amigo do Povo, nº12, Fevereiro/Março/Abril de 2025.

Antonio Galego.

A luta contra a escala 6×1 demonstrou três lições importantes: 1º) as redes sociais e a opinião pública são importantes, mas incapazes (por si sós) de criar os meios de vitória de uma luta como a redução da jornada, que exigirá um processo prolongado de organização e ação direta de massas; 2º) a baixa ou nula inserção das esquerdas (reformistas ou revolucionárias) no setor privado e precarizado limita a força e a legitimidade do movimento; 3º) as tentativas recentes de inserção militante no setor privado evidenciam limites das táticas e estratégias das esquerdas, colocando em xeque os métodos de trabalho de base tradicionais.

Essas três lições, confrontadas com a realidade de tirania burguesa exercido nos locais de trabalho, exige dos militantes classistas uma estratégia política condizente frente a uma situação altamente repressiva, uma nova estratégia de guerra de classes. Não é possível penetrar nesses espaços e ganhar a base das categorias com a estratégia tradicional da esquerda. A estratégia sindical reformista, com seus métodos e ilusões legalistas e democratistas, é incapaz de mobilizar as bases e mudar a correlação de forças entre patrão x empregado nessas condições, leva no máximo à “ganhos de posição”, à conquista do aparato sindical.

Um vez conquistado o aparato sindical e mantendo a estratégia sindical reformista o grupo dirigente se torna incapaz de alterar a correlação de forças patrão x empregado sem lançar mão de métodos de guerra de classes (clandestinidade, sabotagem, greve selvagem, etc.) e se torna cúmplice e impotente frente a tirania patronal. Se essa estratégia é equivocada para quem está no aparato sindical, é mais ainda para um grupo independente ou de oposição.

A palavra de ordem “organizar nos locais de trabalho” cai no vazio se não enfrenta na teoria e na prática as dificuldades dessa organização. Por outro lado, a política de exigência de que as centrais sindicais e partidos governistas “organizem a luta” é não só insuficiente como ingênua e ilusória. Eles não só não querem, mas se quisessem não o conseguiriam, pois as verbas e aparatos não são tudo, o elemento principal da guerra de classes é uma estratégia condizente com as relações de poder e exploração, capaz de transformar dialeticamente o fraco em forte e o forte em fraco.

A estratégia de guerra de classes é um novo pensamento a ser desenvolvido para avançar a luta e organização do proletariado marginal sob condições repressivas. Seu objetivo é a vitória dos trabalhadores sobre os patrões, manejando corretamente a tática e a política, o tempo e o espaço, em contextos altamente repressivos para alterar a correlação de forças. Podemos resumir aqui alguns elementos estratégicos que apresentaremos melhor em outras ocasiões:

  • Ação tipo vespa: Quando um grupo combativo de trabalhadores começa a se organizar a sua debilidade de força lhe obriga a atuar na defensiva, em anonimato, sem se lançar a um combate frontal e decisivo contra os patrões que o levariam a derrota. As ações devem se valer da surpresa, do anonimato, da sabotagem e da rapidez nas retiradas, até que a correlação de forças vá progressivamente alterando e se possa mudar de ações defensivas anônimas para ações ofensivas frontais e públicas.
  • Desmoralizar o patrão, elevar a moral dos trabalhadores: O grupo de trabalhadores deve apoiar a sua categoria em todas as reivindicações, denúncias e para desmoralizar e expor as mentiras e injustiças dos patrões, governos e burocratas sindicais. Por outro lado, a coragem, a combatividade, a coesão e a criatividade dos trabalhadores devem ser estimuladas o tempo inteiro, levando-os à ação sob as condições mais adversas.
  • Ganhar e mobilizar as bases: Preservando ao máximo o anonimato o grupo deve expandir sua atuação e seus membros. Principalmente em grandes empresas é importante deixar claro que não é um “movimento estrangeiro”, que conhece a realidade interna da empresa. Os patrões buscarão desqualificar a revolta como interesse partidário externo, ressentimento pessoal, etc. A legitimidade e independência do grupo combativo deve ser clara e coerente desde a primeira hora. Deve-se ganhar progressivamente o apoio e o envolvimento direto das bases na luta contra a tirania e a escravidão moderna, elas são o principal sujeito de transformação.
  • Luta prolongada: A estratégia de guerra de classes não se consolidará da noite pro dia. Os trabalhadores não irão se expor em ações públicas contra o patrão até sentirem confiança na luta e se convencerem que os riscos valem a pena pela causa dos direitos e da libertação. Deve-se rejeitar a impaciência, as saídas fáceis, ilusórias e superficiais. Fazer agitação a esmo ou com a única inteção de colher resultados rápidos para “calendários de luta” pode não levar aos resultados esperados. O imediatismo levará a atalhos, como mobilizar o “movimento estudantil” ou “exigir” da burocracia sindical, ou seja, fazer o mais do mesmo. Precisamos de uma vanguarda popular preparada para a luta prolongada, munida de uma nova “doutrina” estratégica. A brecha aberta contra a 6×1 expõe o nosso maior desafio para a próxima década: ir ao povo, se inserir nos setores estratégicos, mas ir para ficar.
  • Estruturar retaguarda e apoio social (no âmbito econômico, político, jurídico e moral); Combater a espionagem, o cerco e aniquilação (demissões sumárias, agressões, prisões, processos jurídicos ou tentativas de homicídio); Os dogmatismos ideológicos cedem lugar à teoria e prática concretas; etc etc.

A estratégia de guerra de classes não nasce do nada, líderanças e organizações aplicaram com habilidade, instintiva ou conscientemente, aspectos da arte da guerra de classes nas suas condições concretas. Isso continuará, e a luta contra a escala 6×1 é um momento privilegiado para avançar. Canais de denúncias, panfletagens e protestos são importantes, mas é fundamental articular essas ações em uma nova estratégia, evitando os erros do passado, preparando o terreno para um desenvolvimento mais sólido do poder dos trabalhadores nos seus locais de trabalho, adequado às condições de tirania, adequado a lutar e vencer os patrões, sem imobilismo e sem ilusões. ■

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