Matéria do Jornal O Amigo do Povo, nº3, Setembro/Outubro/Novembro de 2022.
Por Jiren D.
Vivemos tempos de conjuntura difícil para a luta dos trabalhadores, a pandemia piorou as condições econômicas e também a capacidade organizativa dos trabalhadores, junto com aumento da repressão, do estado de exceção, da cooptação dos movimentos socais, nos coloca numa situação delicada para a militância revolucionaria no Brasil.
Além do mais, a militância revolucionaria vive um dilema: existem grupos e organizações que tem atuações mais massificadas que ficam presos no nível de programa mais imediatista e economicista (resolvendo problemas imediatos dos trabalhadores, como salários, direitos básicos e auxílios), mas tem uma dificuldade de avançar num horizonte mais revolucionário o que pode dar margem para militância assistencialista e reformista e, por outro lado, tem grupos com atuações com perfil mais de minoria-ativa, principalmente no movimento estudantil e na educação, que ficam “engessados” num “revolucionarismo auto proclamatório”, porem abstrato e teórico e longe da realidade, se afastando da luta de massa.
Diante desse dilema, cabe aos anarquistas revolucionários refletir e teorizar para dar respostas e corrigir a linha, para ser possível construir uma linha revolucionaria e de massas no Brasil, sem idealismos e sectarismo, levando uma harmonia do programa reivindicativo ao programa revolucionário.
Nos meios anarquistas e anti-estatistas, sempre houve debate sobre o problema do imediatismo, um dos produtos do ativismo, assim como sobre o problema do dogmatismo (ultra-revolucionário), fruto da militância sectária. Se no passado recente eram problemas de distintas formas de atuação, hoje ambos podem ser encontrados dentro das organizações políticas mais rígidas, quanto nas organizações mais frouxas. Atualmente o imediatismo pode ser visto na adesão espontaneísta, sem critérios, às dezenas de mobilizações convocadas pela esquerda reformista, o imediatismo abraça qualquer demanda imediata que aparente justa e perde de vista os objetivos a longo prazo. O dogmatismo ultra-revolucionário trabalha de maneira inversa, tem sempre na ordem do dia reafirmar seu objetivo final, a revolução, em qualquer pauta ou propaganda, por vezes subestima uma mobilização ou reivindicação por ser muito recuada, outras vezes superestima uma greve, ou um ciclo de manifestações de rua mais radicalizadas como eventos quase que revolucionários, onde acabam botando toda a energia.
O imediatismo é resultado da ausência de uma adequada leitura da realidade e da falta de caminho estratégico claro a percorrer, o que acaba levando ao voluntarismo, pois cai numa lógica ativista onde o trabalho político só ganha sentido quando se está “engajado” numa ação, seja ela qual for. O dogmatismo ultra-revolucionário resulta da ausência do trabalho político cotidiano junto às massas populares e acaba levando à abstração da realidade, mesmo quando há um esforço sério em analisar a realidade, pois na falta de inserção social real, passa-se a superestimar as prescrições teóricas, ignorando que estas receitas nem sempre cabem em nossa realidade, esta que está sempre em movimento. Em comum ambos têm a característica de permanente demarcação ideológica típica dos círculos juvenis e acadêmicos de origem pequeno-burguesa.
Imediatismo, dogmatismo, entre outros problemas, possuem várias origens, porém só se enraízam quando as agrupações não estão submetidas às imposições do trabalho cotidiano junto às massas. Não é necessário muito tempo operando junto à bases populares para entender que nem toda ação vale o gasto de energia, por mais justa que seja a sua causa, assim como é difícil manter e atrair militantes do povo somente falando de revolução ou da necessidade de radicalização. No cotidiano das massas, principalmente entre os setores marginalizados, não há tempo e nem energia para ser depositado em maratonas de atividades, assim como não há o mínimo interesse em saber quem é mais revolucionário, as massas valorizam trabalho pragmático, direito e concreto, ou seja, bem materialista.
A tarefa das agrupações anarquistas e anti-estatistas deve ser ir trabalhar junto ao povo, aprender e se capacitar junto a ele, respeitando a sua experiência coletiva histórica, e através desse aprendizado extrair do seu interior as reivindicações que reforcem e enriqueçam nossos programas reivindicativo e revolucionário, para que possamos assim forjar estratégias eficientes a curto, médio e longo prazo. ■