“Renunciaremos tudo, exceto a vitória?” Antifascismo, revisionismo e conciliação de classes

Matéria do Jornal O Amigo do Povo, nº2, Junho/Julho/Agosto de 2022.

Por Antonio “Galego”

“A propaganda [da burocracia da CNT-FAI] havia criado o mito renunciante de Durruti para encobrir sua incompetência e sancionar suas capitulações, levados por sua sede de poder e desejo de eternidade, com o aplauso do PCE, mas isso não era suficiente. Ainda faltava renunciar ao anarquismo, ‘a nossas ideias’, para salvar ‘Espanha’ do ‘invasor’; era preciso tornar-se chauvinistas.” (Miquel Amorós, Durruti en el laberinto, 2014)

O historiador espanhol Miquel Amorós, em seu livro “Durruti en el laberinto”, faz um estudo da ação e das posições de Buenaventura Durruti durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939). Analisa também o conflito direção-base no interior da CNT (Confederação Nacional do Trabalho) e da FAI (Federação Anarquista Ibérica) e destas com as outras tendências políticas (comunistas, nacionalistas, etc.) durante a guerra civil.

Amorós demonstra como a chamada “unidade antifascista” se construiu passo a passo através da conciliação de classes com a burguesia republicana e em negação às conquistas revolucionárias do proletariado em julho de 1936. As jornadas de maio de 1937 em Barcelona são o último suspiro da linha classista-revolucionária em luta contra a linha colaboracionista da burocracia stalinista e libertária.

Durruti e a sua Coluna encarnavam esse espírito revolucionário das massas. Para as burocracias não bastava que Durruti fosse assassinado em novembro de 1936, era necessário deturpar suas ideias e convertê-lo num “herói nacional” de “todos”, em um “mito antifascista”. Assim, Durruti passa de um obstáculo para a linha colaboracionista a um mito a serviço dessa linha. A invenção da frase “renunciaremos tudo, exceto a vitória”, nunca dita por Durruti, foi usada nesse sentido. Muitos anarquistas perceberam essa manobra:

“Em Durruti lhe ‘penduraram’ aquilo de ‘renunciaremos a tudo menos a vitória’ porque servia aos burocratas daquela CNT como um anzol para pescar algumas pastas ministeriais.” (Carta de Peirats à Joan Llarch, em “Un anarquista en la guerra de españa”, Cipriano Mera, 1977).

Atualmente, se fala muito em fascismo, é necessário retomar esse debate: de como a política “antifascista” foi utilizada na história pelo republicanismo burguês e pela socialdemocracia para a conciliação de classes. O caso do Brasil é emblemático: em junho de 2013 as burocracias de esquerda chamaram “blocos antifascistas” em negação à revolta popular e em defesa do governo, e agora o discurso de “união antifascista” (com Alkmin!) é usado para as eleições de outubro. É o discurso antifascista servindo à conciliação de classes e à manutenção do sistema.

Os anarquistas revolucionários precisam aprender com a história. Parar de falar em antifascismo à reboque da política dos reformistas ou de um culturalismo ingênuo. Devemos combater a posição de renegados revisionistas como Federica Montseni, Abad de Santillan, Marianet, etc, ou seja, as capitulações da burocracia “libertária” na guerra civil espanhola. Para nós, o fascismo e a ditadura são manifestações específicas da contrarrevolução burguesa, por isso só podem ser destruídas de fato com revolução social e luta proletária. Não “renunciaremos tudo” para “vencer” Bolsonaro! A vitória só virá com nossa intransigência classista, não só contra o Bolsonarismo, mas também contra o Lulismo e o sistema capitalista de forma geral. ■

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