Matéria do Jornal O Amigo do Povo, nº3, Setembro/Outubro/Novembro de 2022.
Por Érico.
A terceirização do trabalho tem como ideia central a flexibilização dos modos de organização e gestão das atividades, com o objetivo de desonerar o processo produtivo, com foco na atividade ou serviço intermediário ou final da empresa e órgão contratante, promovendo ao máximo o lucro através da superexploração. A assiduidade, a imposição de metas e a maximização do tempo são palavras de ordem das empresas para pressionar os trabalhadores.
As características mais hostis dessa modalidade podem ser verificadas no aumento do desemprego, uma vez que há alta rotatividade dos empregados, o que ocasiona a criação de um “exército de trabalhadores” polivalentes (que atuam em diversas frentes) desempregados. A subcontratação, o decréscimo na quantidade de empregos formais com as empresas contratantes (chamadas tomadoras de serviço), além do enfraquecimento das relações coletivas dos trabalhadores devido a ampliação da competitividade e consequente individualismo são outros males que a terceirização ocasiona aos trabalhadores.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada e publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2015, cerca de 18,9% da população brasileira foram empregadas por contratação intermediária, ou seja, através de uma terceira pessoa ou empresa contratante. Na região Centro-Oeste, 19,1% dos trabalhadores ativos correspondem a essa categoria. Dados mais recentes do Tribunal de Contas da União (TCU), mostram que na esfera Federal de governo há cerca de 80 mil trabalhadores terceirizados que prestam serviços nas empresas estatais, órgãos governamentais como ministérios e autarquias.
Brasília, capital federal, concentra a maior parte dos órgãos e autarquias do Governo Federal, além daqueles da administração distrital. A terceirização do trabalho está nas instituições de ensino, de saúde, nas empresas públicas e privadas, geralmente com trabalhadores alocados aos serviços que não são os produtos finais daquela instituição, organização ou empresa. São trabalhadores contratados por uma terceira empresa para executar os serviços de atividades específicas, sendo elas responsáveis dos encargos trabalhistas. Geralmente, essas mesmas empresas não possuem condições financeiras necessárias para arcar com a responsabilidade dos direitos dos trabalhadores.
Em 2017 foi sancionada a Lei da Terceirização (13.429/17) que permitiu a terceirização em todos os níveis das atividades e serviços nas empresas públicas e privadas. É interessante notar que dos 296 deputados que votaram a favor da terceirização, 163 são empresários, e a maior concentração dos votos favoráveis estava nas mãos dos políticos-empresários que possuíam mais que 10 empresas.
E o envolvimento de empresários ou políticos em contratos com as instituições públicas é corriqueiro. Casos como o de Eliana Pedrosa e o sobrinho Eduardo Pedrosa, que já captaram 795 milhões de reais de dinheiro público ao longo de 15 anos, ou o de Robério Negreiros (dono da Brasfort) que já recebeu mais de 1 bilhão do GDF desde 2007 são exemplos desse sujo e sínico envolvimento.
Também não são raros os casos de corrupção, assédio moral e desrespeitos diversos em relação aos direitos trabalhistas na relação das empresas contratadas a prestar serviços às instituições públicas. No Distrito Federal podemos citar alguns casos:
Em 2018, o deputado distrital José Gomes foi condenado após denúncias de coação eleitoral a 10 mil trabalhadoras e trabalhadores terceirizados da empresa Real JG. Na época a empresa era gerida por José Gomes, que passou a gestão à família quando assumiu a vaga da CLDF.
Além desses casos, trabalhadores terceirizados sofreram ainda com o desprezo por suas vidas, trabalho e família no auge da pandemia de Covid-19. As empresas RCA e Servitium que prestavam serviços para a Universidade de Brasília descumpriram direitos trabalhistas. Houve demissão em massa de funcionárias do grupo de risco, além de casos de assédio moral, e não pagamento dos encargos.
Ainda tratando de serviços prestados a instituições públicas, denúncias veiculadas por nós mostraram o descaso com as trabalhadoras da empresa BrBPO, que presta serviços de atendimento nos canais 100 e 180 para o Ministério da Mulher, Família e dos Direitos humanos (MMFDH). E os casos se repetem: demissões recorrentes e arbitrárias, assédio moral e falta de isonomia remuneratória/descriminação geográfica em relação a trabalhadoras que realizam o mesmo trabalho na empresa em filiais distintas em Goiás e Distrito Federal.
São poucas as nossas páginas para registrar a imensidão de irregulares e abusos que essas empresas representam para o trabalhador. Há uma clara dificuldade para as trabalhadoras e trabalhadores em se organizar através dos sindicatos de suas categorias, uma vez que esses são facilmente manipulados por patrões e donos de empresas em acordo com os dirigentes sindicais. Nossa defesa, porém, é que a organização autônoma desses trabalhadores, e a construção da luta coletiva contra os abusos, precarização e insegurança, são os únicos caminhos para reverter a situação exaustiva e desumana praticada por essas empresas. A precarização do trabalho é um projeto não só dos empresários ricos, é, também, do Estado. ■