Matéria do Jornal O Amigo do Povo, nº5, Abril/Maio/Junho de 2023.
Aurora.
Nós anarquistas quando nos referimos ao 1° de maio costumamos rememorar os mártires de Chicago que deram sua vida pela justa luta em prol da redução da jornada de trabalho. Esta memória histórica, assim como de outras lutas contra a opressão dos trabalhadores, é fundamental para fortalecermos nossa identidade coletiva, para pensarmos nos desafios impostos para classe trabalhadora nos próximos períodos e também para situarmos o anarquismo onde ele deve estar: enquanto uma teoria e ideologia que tem como cerne a luta pela liberdade. Mas afinal, o que é liberdade para o anarquismo? O que a luta contra a exploração do trabalho tem a ver com ela? Quem são os principais sujeitos e coletividades que devem impulsionar esta luta?
O papel do trabalho para a conquista da liberdade
Para respondermos tais questões vamos recorrer a Bakunin que cunhou uma importante reflexão sobre o tema. Para o russo, a liberdade estaria intrinsecamente ligada ao trabalho. Isto porque em sua concepção os seres humanos, ao contrário do que defendem os liberais, não nasciam livres. No início do mundo social estes se encontrariam em uma profunda dependência do mundo natural, o progressivo descolamento do mundo social para com o mundo natural, seria um processo a ser conquistado a partir do trabalho e do aprendizado próprio à sua realização.
A conquista da liberdade seria, portanto, inerente à natureza humana que em seu impulso de diminuir sua dependência para com a natureza procura modificá-la e transformá-la. Nesse processo se geram aprendizados que são tanto captados pelo indivíduo que realiza o trabalho, quanto pela coletividade que o circunda. Se tornando independente, mas convém ressaltar que nunca completamente, da autoridade da natureza transformando-a (mas nunca dominando-a) para garantir a sua sobrevivência, os seres humanos estariam indo em direção da conquista da liberdade.
O aprisionamento do trabalho e o papel da classe trabalhadora na luta pela libertação
Em suma, para Bakunin apesar da luta pela liberdade ser própria da natureza humana, a liberdade não é inata, mas sim algo conquistado a partir da articulação entre o trabalho e o pensamento (ação e reflexão, onde esta depende daquela). Entretanto, na nossa sociedade o trabalho foi aprisionado, a sua organização tem sido imposta aos trabalhadores, de forma contrária aos seus interesses e anseios. Os frutos do trabalho não voltam para o próprio trabalhador nem para sua coletividade. Nesta forma de organização social o trabalho deixa de ser libertação e passa a ser prisão e sofrimento.
Sendo assim, em nossa sociedade a luta pela liberdade é primordialmente uma luta pela libertação da exploração do trabalho. A luta pela libertação só pode ser impulsionada por um sujeito: a classe trabalhadora. Como afirmara Proudhon (2001, p. 30), “se a reflexão, e por consequência a ideia, nasce da ação e não a ação nasce da reflexão, é o trabalho que deve prevalecer sobre a especulação, o homem de indústria sobre a filosofia […]”. Logo, os agentes primordiais da liberdade são aqueles que vivem do trabalho, ou seja, é na classe trabalhadora que reside a verdadeira potência de luta pela liberdade.
Organizar a classe trabalhadora para alcançar a liberdade
O anarquismo surgiu no seio da classe trabalhadora, esta é uma ideologia/teoria da classe trabalhadora para a classe trabalhadora, logo, suas reflexões e ações não são por acaso. É por isso que os anarquistas historicamente sempre estiveram junto ao povo trabalhador, envolvidos em lutas pelos direitos dos que vivem do trabalho, organizando sindicatos, associações, greves, etc. Enquanto perdurar a subjugação do trabalho pelo Estado e o Capital é junto aos trabalhadores que deve estar.
Neste sentido, nesse 1º de Maio, mais do que evocar as memórias históricas convidamos os anarquistas a contribuírem e organizarem lutas junto ao povo trabalhador. Independentemente se o governo que temos é de direita ou de esquerda, se utiliza ou rejeita linguagem inclusiva, se é mais ou menos retoricamente simpático as causas populares, temos que ter em mente que nós lutamos pelo fim da opressão do trabalho e ela só virá com a abolição de todos os governos impostos de cima para baixo e com a abolição da propriedade privada dos meios de produção. Nós lutamos pela liberdade, nós lutamos com os trabalhadores! ■