A lição da greve na educação catarinense: é preciso retomar nossas organizações de classe

Publicada no Jornal O Amigo do Povo, nº10, Agosto/Setembro/Outubro de 2024.

Coletivo Trabalhadores em Luta (CTL)

Entre os dias 23 de abril e 08 de maio, os trabalhadores em educação de Santa Catarina se levantaram em greve, depois de 9 anos sem acionar essa tática de luta. O magistério catarinense vem sofrendo um processo de precarização há décadas: o estado de SC não paga o piso da carreira nem 1/3 de hora-atividade, e mais de 60% dos trabalhadores são temporários, com contratos que duram no máximo um ano letivo, ficando sempre sem salário nos meses de janeiro e fevereiro. A greve reivindicava principalmente o pagamento do piso, a descompactação da tabela salarial, a realização de concurso público e a revogação do desconto de 14% no contracheque dos aposentados.

Apesar da justeza e urgência das pautas, a adesão da categoria ao movimento grevista foi tímida. Além da intensa precarização que dificulta a conscientização e organização dos trabalhadores, uma das grandes razões para a baixa participação foi a desconfiança em relação ao sindicato oficial, construída com base em um histórico de traições (a última delas, em 2015, que infligiu grave derrota e gerou a perda de diversos direitos, ainda é uma chaga aberta no coração da categoria). A direção estadual, da Articulação Sindical (CUT/PT), que há mais de 15 anos controla o sindicato, passou boa parte do ano de 2023 freando o ímpeto de luta da base e tentando negociações de gabinete com o governo de Jorginho Mello (PL), que adiou inúmeras reuniões ou enviou o “baixo escalão” de sua cúpula sem proposta nenhuma para apresentar. A direção cutista só passou a defender a greve em 2024 porque esta se mostrava ferramenta útil para desgastar o governo em um ano eleitoral, beneficiando o PT na disputa com o PL pelas prefeituras.

A greve foi levada adiante pelos trabalhadores organizados em seus comandos de greve regional que, com muita valentia, resistiram a diversas perseguições e ameaças do governo, das coordenadorias de educação e das direções escolares. O movimento foi encerrado antes que as pautas fossem atendidas, em mais um golpe da direção sindical contra a democracia e a organização de base. Em data prevista para a realização de um ato, foi organizada uma assembleia sem prévia convocação para apresentar a proposta de “suspensão” da greve por 60 dias, com base apenas em uma promessa de acordo com o governo.

Para cumprir o papel sujo de desmobilizar os lutadores, a Articulação colocou o jurídico do sindicato para coagir a categoria alegando que a continuidade da greve seria uma irresponsabilidade e que se algum trabalhador sofresse perseguição, o jurídico e o sindicato não iriam defender. A direção cutista não teve nem a coragem de assumir sua posição pelega, disfarçando-a sob um discurso falacioso de questões técnicas e jurídica. Apesar da resistência da oposição, a proposta de “suspensão” foi vitoriosa e a categoria retornou ao trabalho sem vitórias e com o fardo da reposição de aulas.

Após a “suspensão” da greve, foi lançado o edital do tão esperado concurso público, mas com um número de vagas muito aquém do necessário e todas apenas com jornadas de 10h ou 20h. Foi anunciada a reversão de um retrocesso nos direitos dos professores laboratoristas, mas houve retrocesso no tempo mínimo para pedido de licença para pós-graduação. Por fim, em julho o governo apresentou uma proposta muito rebaixada de reajuste salarial, que continua não pagando o piso e mantém a tabela salarial compactada.

O saldo contraditório dessa greve oferece duas lições: 1) nada é tão perigoso para um patrão (seja empresário ou governante) quanto a paralisação dos trabalhos. A greve segue sendo a principal arma dos trabalhadores contra as injustiças do cotidiano, mas o poder de fogo desta arma depende diretamente da preparação prévia neste mesmo cotidiano. Categoria desorganizada e desiludida não faz greve forte e não conquista vitórias. 2) o resultado da política defendida pela burocracia sindical do Sinte – as negociações com o governo sem a classe trabalhadora mobilizada para pressioná-lo coletivamente – é sempre a conquista de poucas migalhas às custas de muita perseguição e repressão.

É para transformar essa situação que o Coletivo Trabalhadores em Luta (CTL) busca organizar a legítima desilusão e a revolta da categoria contra o peleguismo sindical, para construir uma força coletiva capaz de revolucionar o sindicalismo e as condições de trabalho na educação. Retomar nossa organização nos locais de trabalho, para retomar nossas organizações de classe é o primeiro passo desse processo, absolutamente necessário para romper o ciclo de traições e derrotas e nos dar a força para tornar realidade o ideal de uma educação de qualidade para os trabalhadores. ■

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