
Comunicado nº3 do Grupo Libertação Popular – GLP, Brasil, dezembro de 2024.
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A memória do 1º de Maio ainda hoje é uma ameaça ao sistema. Por isso os ricos, os políticos e burocratas sindicais tentam apagar e, principalmente, distorcer essa memória. Ou então a colocam como uma “peça de museu”, assunto para “artigo acadêmico”, sem relação com a realidade atual da massa de trabalhadores. São as únicas formas deles se apropriarem dela e, ao mesmo tempo, negarem-la completamente.
Ainda hoje vivemos no Brasil uma brutal exploração, carestia de vida, jornadas de trabalho exaustivas, informalidade, retrocessos sociais e trabalhistas, precarização de serviços de saúde e educação, repressão estatal e paramilitar, perseguição patronal. Temos muitos motivos para lutar! Por outro lado, nos faltam instrumentos organizativos e estratégias de luta adequadas. A maioria dos sindicatos e partidos da esquerda (PT, PCdoB, PSOL, CUT, CTB, etc.) estão vendidos e desmoralizados por décades de conciliação de classes. Essa burocracia sindical e partidária é o exato oposto do espírito de luta do 1º de Maio.
Por isso é importante resgatar nossa história, aprender com ela, divulgá-la para as massas, pois ela nos dá pistas de onde e como caminhar para reorganizar a nossa classe, retomar a confiança dos trabalhadores em sua auto-organização e luta direta por seus direitos, rompendo com as amarras governamentais e patronais, enfim, construindo hoje as alternativas de organização e luta para a vitória final dos trabalhadores.
Os Mártires de Chicago e a verdadeira história do 1º de maio
Em 1886, na cidade de Chicago, estado de Illinois, EUA, havia um movimento operário em ascensão, impulsionado por uma reivindicação de grande apelo popular: a redução da jornada de trabalho para 8 horas, num contexto em que os operários chegavam a trabalhar 10, 14 e até 16 horas diárias.
Agindo entre os trabalhadores, líderes operários capacitados e determinados tinham no anarquismo seu pensamento-guia para analisar e transformar a realidade. Defendiam uma estratégia sindical revolucionária baseada na independência da classe trabalhadora em relação à burguesia e ao Estado, na ação direta e na greve geral insurrecional para a construção de uma nova socidade.
Essas lideranças estavam organizadas na Associação Internacional do Povo Trablhador (IWPA, na sigla em inglês), uma organização que nasceu em 1883 a partir de lideranças anarquistas e de “clubes social-revolucionários” que rompem com o Partido Trabalhista Socialista dos EUA. A IWPA em pouco tempo alcança a influência nos principais sindicatos de Chicago e em outras cidades do país.
Opostos a esse movimento estavam os patrões, autoridades do Estado e a imprensa burguesa de Chicago, amedrontados e determinados a ir às últimas consequencias para sufocar o que identificavam como uma ameaça aos seus privilégios.
Como acúmulo dessa radicalização, no dia 1º de maio de 1886 foi marcada uma greve geral em Chicago. Os grevistas estavam dispostos a mantê-la até o atendimento das reivindicações. As atividades da cidade foram interrompidas e começou uma passeata de milhares de trabalhadores rumo a praça Haymarket. A passeata acabou num comício gigantesco e encerrou pacificamente.
Porém, no dia 3 de maio a violência policial recaiu forte sobre os operários grevistas da fábrica McCormicks. A polícia chegou atirando, ferindo, matando e espalhando o caos entre os trabalhadores. Como resposta os líderes anarquistas chamam um novo comício de denúncia para o dia seguinte.
No dia 4 de maio, na praça Haymarket, um grande comício se realizava pacificamente, com os oradores conclamando a união e a coragem dos trabalhadores para enfrentar a violência da burguesia. Perto do fim, porém, uma bomba explodiu entre os policiais, matando meia dúzia de pessoas e ferindo dezenas de outras. Em reação, a polícia atirou indicriminadamente contra a multidão, multiplicando os mortos.
Esse atentado (nunca esclarecido a verdadeira autoria) serviu de pretexto para uma perseguição brutal contra o movimento, cujo ponto máximo foi a prisão, condenação e enforcamento dos mais destacados líderes operários, todos anarquistas: Alberto Parsons, Samuel Fielden, Luis Lingg, Augusto Spies, Miguel Schwab, Jorge Engel, Adolfo Fischer e Oscar Neebe. Destes, Fielden e Schwab foram condenados a prisão perpétu; Neebe a 15 anos de cadeia; os demais à pena de morte.
O processo contra os operários anarquistas foi marcado pelo ódio de classe da burguesia, mas também pelo heroísmo e coerência dos condenados (registrado para sempre em seus discursos, proferidos após as sentenças), assim como pela solidariedade internacional. Assim, em 1899, em um congresso operário em Paris o dia 1º de Maio foi escolhido como Dia Internacional de Luta dos Trabalhadores.

Retomar o caminho de luta classista e combativo dos trabalhadores
O 1º de Maio é um dia de Luto e de Luta. Das experiências e mártires do passado tiramos nossa força para seguir lutando hoje contra o mesmo inimigo: o sistema capitalista que explora e oprime as massas trabalhadoras no Brasil e no mundo todo.
Hoje, porém, o movimento dos trabalhadores passa por uma forte crise de organização e direção a nível global. Nos falta um instrumento organizativo e de ação que represente um poder real dos trabalhadores e povos oprimidos de todo o mundo contra os projetos da burguesia e do imperialismo, assim como foi a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) no século XIX.
Na falta desse instrumento classista, e reinando a fragmentação, o confusionismo e a impotência da nossa classe, proliferam-se a algumas décadas, por um lado, as “soluções” dogmáticas de uma esquerda radical presa nas camadas médias e sem penetração popular, e por outro, e ainda mais importante, amplia-se a conversão da socialdemocracia/comunismo em gestores responsáveis da ordem capitalista “contra o fascismo” e como forças auxiliares de blocos burgueses em disputa (EUA x China, Lula x Bolsonaro, etc).
Urge uma associação internacional que possa intervir, com ações concretas e poder real, com uma linha classista e combativa, nesse cenário internacional de acirramento das guerras (Palestina, Ucrânia, Síria, etc.), frente às empresas capitalistas globais e ao aumento da escravidão, da informalidade e outras formas de exploração, frente aos desastres ambientais e ataques aos camponeses e povos oprimidos, impulsionando e apoiando (sem dogmatismo de “correntes”) as lutas, levantes e revoluções na América Latina, Oriente Médio, etc.
Essa estratégia não pode se perder de vista, devemos caminhar no seu rumo, guiando nossas tarefas diárias e locais, por mais pequenas que sejam. Ela não cairá do céu. A reconstrução do poder de pressão global dos trabalhadores se dará de baixo para cima, da mobilização de massas por reivindicações concretas, e não de líderes iluminados com “boas ideias”.
Assim como os anarquistas fizeram em maio de 1886, devemos atuar sobre a nossa realidade concreta, com um método materialista de mobilização, que impulsione através da auto-organização, intransigência classista e ação direta, as reivindicações mais sentidas da nossa classe (redução da jornada, contra a carestia, fim da violência policial, por terra e moradia, por salário e emprego, etc.). É apenas sobre esse terreno de acirramento da guerra de classes que qualquer ação revolucionária e socialista pode avançar. É esse terreno que deu origem ao 1º de Maio, e é esse o terrenos que o Estado, a burguesia e as burocracias sindicais mais temem.
Precisamos formar e unir lideranças populares, com firmeza ideológica, não-dogmáticas e bem capacitadas para a luta. Há alguns anos temos lutas importantes (entregadores, caminhoneiros, camelôs, fim da 6×1, indígenas, etc.) em que ativistas e organizações são capturadas para o campo Lulista ou Bolsonarista, traindo suas bases e se desmoralizando, e onde setores combativos tem pouca ou nenhuma influência.
É hora de ir ao povo! Isso significa ruptura com as agendas e vícios pequenos-burgueses que infestam a esquerda, mas principalmente um trabalho sério de penetração nos setores estratégicos do proletariado, desenvolvendo métodos de luta e organização no setor privado, informal, transporte, industrial, agro e mineração, favelas, cidades de interior, etc.
Nesse 1º de Maio todos nós, lutadores do povo, socialistas revolucionários, temos uma grande responsabilidade em nossos sindicatos, oposições sindicais, coletivos anônimos de trabalhadores (em empresas com alta repressão), movimentos populares e favelas: Manter viva a chama da revolução social! Reorganizar nossa classe para o combate, por uma vida digna e pela libertação! ■