Publicado no Jornal O Amigo do Povo, nº15, Novembro/Dezembro de 2025.
Antonio Galego.

Muito se fala sobre Emendas Parlamentares na mídia burguesa e na sociedade em geral. Hoje, por exemplo, a realização de “benfeitorias” básicas na Saúde e na Educação estão atravessadas pela dependência imoral dessas Emendas. De certa forma, a escandalosa PEC da Blindagem, derrotada no Congresso, é um subproduto de uma década de aumento do poder dos parlamentares. Mas o que são as Emendas, quais as suas consequências na política e na luta de classes, e por que isso é importante para os revolucionários e militantes classistas?
Uma década de fortalecimento e ajustes
As emendas parlamentares são recursos públicos destinados à deputados e senadores para a realização de obras e projetos. Desde a Constituição de 88 esses recursos precisavam ser aprovados pelo Presidente (Poder Executivo), que usava dessa prerrogativa como poder de barganha para manter a governabilidade e pressionar o Legislativo, o famoso “toma-lá-dá-cá”.
Em novembro de 2013 foi apresentada a PEC 358 que propunha o “orçamento impositivo”, tornando obrigatório o repasse de verbas aos parlamentares. Após todos os trâmites a PEC 358/13 foi aprovado pela Câmara em 2015 com a orientação favorável de todas as bancadas e com um placar incrível de 452 votos favoráveis, 18 contrários e 1 abstenção. Os deputados do PCdoB, PSOL, PDT, PSB, PV, DEM, PSDB, PSC, PSD e outros votaram integralmente favoráveis. Somente alguns gatos pingados do PMDB, PP, PR, PTB e do PT votaram contra. A única preocupação do governo Dilma e do PT à época era o impacto disso no ajuste fiscal em curso!
As Emendas Parlamentares foram fortalecidas em 2019 e 2020, durante o governo Bolsonaro. Três mudanças ocorreram: a inclusão das “emendas de bancada” (Emenda Constitucional 100); a criação das transferências especiais, conhecidas como “Emendas Pix” (EC 105, de autoria de Gleisi Hoffman/PT); e a ampliação dos recursos para as “Emendas de relator”, conhecidas como “orçamento secreto”.
Para além dos tipos, há um crescimento gigantesco das Emendas na última década. Apesar de, em campanha eleitoral, Lula ter criticado o esquema como a “maior bandidagem da República”, o seu governo vem batendo recordes. Lula é o campeão da demagogia! O projeto da LDO para 2026 (ano eleitoral!) prevê R$ 54,2 bilhões em emendas para as ratazanas do Congresso. Ou seja, apesar de toda demagogia e medidas de transparência pelo STF, as Emendas seguem se fortalecendo como instrumento de poder de deputados e senadores, tanto no interior do Estado, quanto na relação destes com a sociedade.

Clientelismo e patrimonialismo renovados? As Emendas e seus impactos na política brasileira
Patrimonialismo é quando a classe política se utiliza do Estado para obter benefícios próprios, familiares ou para grupos específicos. Ao ser destinado um volume cada vez maior de recursos públicos para os parlamentares através das Emendas, e diante de tantas carências do nosso povo e da crise de organização do proletariado, o que tem se verificado é a imoral e descarada política de favores como meio de manter influência e lealdade eleitoral assim como favorecer interesses particulares e aliados políticos.
Ter uma biblioteca no bairro não é mais um direito, se torna um favor concedido por um parlamentar específico, “amigo da comunidade” (sic!). Para se ter noção, “nos últimos 11 anos, 46% do crescimento do orçamento do SUS teve sua destinação determinada por emendas parlamentares” (IEPS, 2025). A população, carente dos direitos mais básicos, é a presa perfeita desses vampiros. É a lei da oferta e da demanda na selva neoliberal: parlamentares, ONGs e empresas disputam seus “clientes” que irão se beneficiar. Mas há um preço. O clientelismo surge da troca de favores entre o poder e um grupo específico de pessoas em troca de votos ou apoio. Muitas lideranças locais (de prefeituras, igrejas, sindicatos, escolas, associações de bairro, etc.) participam do esquema, se integram, dependentes das migalhas. E onde há sortudos, há os “azarados”, os que não dão voto, que não dão “likes and vews”.
Assim, a mudança no exercício do poder burguês não se restringiu às disputas palacianas, se projetou na sociedade, se infiltrou nas organizações populares e transformou (pra não dizer, corrompeu) a ideologia das lideranças. A luta classista e reivindicativa tem se diluído na forma de troca de favores e conchavos com parlamentares. Os parlamentares têm transformado movimentos e lideranças em vitrines, com profusão de relatos de “clientes satisfeitos”, abraçados com o político da vez. Muitas lideranças, apesar de críticas ou desconfiadas, sofrem pressão real para se submeter à lógica clientelista, sob o risco de não terem resultados concretos em suas demandas. Assim, as Emendas ampliam a crise da classe trabalhadora, minando a luta coletiva e colocando as lideranças de joelhos.
A crítica liberal e republicana às Emendas, partilhada pelo STF, PT e seus asseclas, não combate o cerne do problema, se centra em dois aspectos: 1º) Criticam a corrupção e a falta de transparência, propondo regras como as do STF que exigem a rastreabilidade das emendas; 2º) Criticam os excessos no volume de recursos, tanto por ocuparem a Presidência (questão conjuntural) quanto por serem fiéis zeladores do Novo Teto de Gastos (questão estrutural). Os políticos de direita aceitam essas ponderações. São “óleo e verniz” para as engrenagens funcionarem melhor e serem mais aceitas. Ao fim e ao cabo, parlamentares de esquerda e direita tem se adaptado às novidades no exercício do poder burguês, disputam os recursos, beneficiam suas bases, fazem troca de favores, enfim, garantem sua sobrevivência político-eleitoral, que é afinal a única coisa que de fato importa na República dos Ratos.






