Um autêntico Programa Revolucionário deve emanar da realidade concreta das Massas Populares!

Publicado no Jornal O Amigo do Povo, nº8, Fevereiro/Março/Abril de 2024.

Antonio Galego

Uma atuação política eficiente deve levar em consideração a realidade da classe ou camada social que se organiza ou se pretende organizar. Essa realidade abarca principalmente as condições materiais de vida (econômicas, políticas e sociais), mas também as subjetivas e ideológicas.

Hoje, tanto a esquerda como a direita tendem a desconsiderar as massas. A esquerda elegeu a aristocracia operária e dos serviços públicos, e uma pequena-burguesia progressista metropolitana, como modelos ideais do que seria (ou deveria ser) a “classe trabalhadora”. A direita também criou uma ideia distorcida de “trabalhador” baseada nos pequenos e médios empresários, “empreendedores”. Ainda que esquerdistas e direitistas se afirmem “representantes” da classe trabalhadora ou do povo brasileiro, estão longe disso, conseguem apenas expressar (parcialmente) os interesses e simbologias dessas camadas médias da sociedade.

Por outro lado os setores revolucionários, presos a dogmatismos políticos, tendem a querer encaixar uma visão idealizada do proletariado em suas “bíblias” e seus “profetas” mais ou menos corretos. Esquecem muitas vezes que um autêntico programa revolucionário deve emanar das condições materiais de vida das massas, de suas reais necessidades e conflitos em um dado contexto histórico, social e geográfico. Essa é a forma correta de um debate programático. Como diria Bakunin:

“A sociedade, no grande sentido da palavra, o povo, a vil multidão, a massa dos trabalhadores, não só dá a força e a vida, mas também dá os elementos de todos os pensamentos modernos, e um pensamento que não sai do seu seio e que não é a expressão fiel dos seus instintos populares, segundo a minha opinião, é um pensamento que já nasceu morto.”

Portanto, as disputas programáticas não se dão no campo puro das vontades e ideias. A revolução não será “democrática”, “nacionalista”, “socialista”, etc. (pra não falar “feminista”, “anti-especista”, “anti-capacitista”!) porque tal organização ou indivíduo assim deseja, ou porque tem um argumento ótimo e racional. A possibilidade de disputa dos acontecimentos da luta de classes, sob um ponto de vista revolucionário, está relacionada a capacidade de dar respostas às necessidades concretas das massas através de ideias e ações, não de “criar” necessidades e “mudar/manipular/educar” as massas para que estas atendam interesses alheios a elas.

Servir ao povo, e para isso é preciso conhecê-lo. Portanto, as disputas programáticas entre diferentes correntes políticas deveriam ser menos uma tentativa de convencimento do povo e recrutamento de seguidores de acordo com seus dogmas ideológicos, e mais uma tentativa de entendimento da realidade para melhor servir aos trabalhadores em sua prolongada luta de libertação.

Nas próximas edições vamos dar continuidade a esse debate. Mas vejamos rapidamente alguns dados. Segundo o IBGE cerca de 70% da classe trabalhadora recebe até 2 salários mínimos. Já os que ganham até 1 salário mínimo são 35% da força de trabalho. A taxa de sindicalização é a menor da história (9,2%). Quase 20% dos jovens de 14 a 29 anos sequer terminaram o ensino médio, e 80% de toda população brasileira acima de 25 anos não tem curso superior. Pipocam os casos de trabalho escravo relacionados ao avanço da terceirização e da flexibilização de direitos, agravados com a reforma trabalhista de Temer (que não foi revogada por Lula, como prometido nas eleições).

Basta pensar um pouco sobre esses dados e perceber porque esquerdistas e direitistas estão em crise, sem conseguir um envolvimento da massa trabalhadora em seus projetos. Suas preocupações, agendas e programas estão dissociados da realidade vivida pelo Brasil profundo. Cabe aos revolucionários socialistas se distanciarem desses charlatões preocupados com votos, likes e riquezas, e irem ao povo, a essa massa popular, que como diria Bakunin é a única fonte de um pensamento vivo e, como disse Carlos Marighella: é o segredo da vitória. ■

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